Um serviço para ajudar a captar clientes de uma startup de design colaborativo iniciou uma reflexão sobre o valor das coisas no mundo do design.
Dia desses, estávamos debatendo em nossa comunidade no Slack um produto digital muito curioso, o quantocustaumlogo.com.br. Seu funcionamento é simples: ele se propõe a fazer uma brincadeira com a questão de um orçamento justo para a criação de identidade visual de uma marca e, ao final, discute o valor proposta, linkando com o serviço de design colaborativo que o originou. Descontando aí toda a questão da concorrência especulativa, velha conhecida dos "treteiros" do meio, a brincadeira inusitada disparou uma discussão muito relevante para quem trabalha com algum tipo de direção de arte ou depende dela para seu negócio deslanchar. Ao iniciar o papo, o Rafael Apocalypse, que hoje é developer no Mercado Livre, mas é antigo colaborador aqui do site foi categórico: “É ruim? É. É bom? Também é!" Ele seguiu explicando que, ao se formar em design gráfico no final de 2007, o conceito de “sobrinho” já era mais do que conhecidos. “Desde que a profissão existiu”, lembrou. A ideia de se formar para ter que fazer logo por R$500, trabalhar em sites de concorrência especulativa etc não faz parte dos planos de quem começa? O famoso, "faço porque estou começando?" Que nada, a gente sai da faculdade, segundo Apocalypse com aspirações maiores. A grande questão, no entanto, é que este tipo de serviço existe e o cara que faz o logo por R$ 500, está trabalhando e isso é bom e quem opta por “comprar” esse serviço provavelmente também sabe que a qualidade pode ser proporcional ao preço pago.Eu estudei para trabalhar em projetos em que o valor do meu conhecimento é “reconhecido”. Eu estudei para ajudar a criar marcas (ou a parte visual delas), não para criar um logo completamente não relacionado à empresa/produto.Outro de nossos slackers, o Lazaro Alvarenga - que atua como Líder de Marketing em diversos projetos online - , foi mais além, analisando duas matrizes bem interessantes a se pensar nisso tudo: [agg_tabs theme=”dark”] [agg_tab title="Cliente não pode pagar"] A questão aqui não é se vale ou não, é certo tipo de cliente simplesmente não terá problemas do cliente, desenvolvemos o negócio dele. Ou seja, ele investe 2k numa ID e precisa de um retorno lógico para cobrir esses 2k, custos de negociação, tempo, ele e ainda apresentar um lucro. Sintetizando: será que o ROI para uma ID que custe 2k ao tio do churrasquinho é realmente interessante pra ele? [/agg_tab] [agg_tab title="Você não soube vender"] Será que ele vê valor em fazer algo com você? Pensa comigo, se a starbucks tivesse uma experiência de venda e relacionamento igual ao bar da rodoviária, eles não poderiam cobrar tão caro num café ralo como aquele. Produto nenhum "se vende" sozinho. O processo de venda tem que ser bem formatado para justificar tudo. Os designers precisam aprender a perder um pouco desse preciosismo deles. [/agg_tab] [/agg_tabs]
Seria, então, questão de preciosismo?
Foi um caminho que o Tiago Ramon, Diretor de Arte online, sugeriu. Segundo ele, os designers teriam que perder o preciosismo. Tem muita gente que quer cobrar caro pelo trabalho, mas no fim, acabam fazendo um trabalho igual a de um site de leilão de freelancers.Sem envolvimento, sem vontade de realmente fazer algo bacana. E vai mais além, o tipo de empresa em questão não cria identidade visual, apenas logos. E isso não significa nada. São apenas desenhos que não trás nenhum tipo de valor para a empresa. Seu ponto, no final, é que sites de concorrência especulativa não seriam concorrentes do designer tradicional. “Nós, também temos o direito de dizer não ao cliente chato, ao cliente mala, ao cliente explorador que existe aos montes por aí.”, afirma Tiago.O que seria um bom logo, afinal?
Um logo ruim não é apenas um logo que não representa a marca, é um logo de difícil reprodução, que você não consegue usar sobre um fundo escuro ou claro demais, que perde-se se existem outros elementos próximos demais, ou que é “lugar comum”. O Swoosh da Nike custou 35USD, vale milhões, não pelo desenho, mas pela qualidade dos tenis e artigos que tem o desenho estampado. O logo da Starbucks já mudou muito ao longo do tempo, os cafés continuam caros, a marca vale alguns bilhões, e as atualizações pelas quais passaram focaram sempre na faciliade de reprodução do desenho. Em suma, um logo pode ser bom ou não, mas tudo o que o circunda pode ser muito mais importante que o desenho, e mesmo um desenho ruim, pode ter como dono, uma marca multi-bilionária. Para complementar esse ponto, dá uma olhada neste vídeo que publicamos outro dia, com o Michel Bierut, criador do logo da campanha da Hilary Clinton.Eu mereço mais design do que você?
Mas, me parece que o grande ponto aqui é que existem clientes que “merecem” um trabalho bem feito e outros não. É isso que me incomoda nessas plataformas. Eu acho que elas seriam um ambiente mais assertivo se viabilizassem o bom trabalho com custos ajustados ao tamanho do cliente e não ajustando a qualidade do trabalho ao tamanho do cliente. Sei que pode parecer que essas coisas são a mesma (qualidade e preço) mas acho que a gente esbarra em questões mais profundas quando joga com essas variáveis. Ética, por exemplo. Na minha cabeça o trabalho tem que ser top sempre. Até porque sou eu quem estou fazendo. Logo, eu devo ser top sempre (falando aqui de forma conceitual, não estou me gabando, ok?) Logo, o ambiente deveria ter um objetivo, viabilizar o acesso de pequenas empresas a bons trabalhos e resolver a questão da escalabilidade de preço, mas não em detrimento da qualidade. Isso, claro, se não levarmos em conta o funcionamento interno deste tipo de ferramenta, como prosseguiu o Tiago: “Quando um designer pega um job, ele quer conhecer mais a fundo a empresa, conversar com o cliente para entender o que ele realmente espera do trabalho.” Nessas plataformas o cliente tem a opção de receber uma arte em poucas horas e fazer alterações infinitas. Alterar o trabalho muitas vezes é muito provavelmente um problema de briefing. E nessas plataformas o briefing deve ser muito raso. Então, no meu ponto de vista, o trabalho já começa errado, segundo ele. Mas, vale lembrar, que até mesmo designers em início de carreira podem entregar um bom trabalho se todo o processo for feito de forma próxima ‘a da ideal, como no caso de um briefing bem feito. Aliás, é nisso que está baseado o conceito de qualidade em trabalhos criativos: o melhor que se pode fazer, em menos tempo e seguindo as limitações do projeto. Por natureza sempre haverá alguém melhor, e alguém melhor faz um trabalho melhor, por isso sua hora/trabalho é mais cara, e ai os preços diferem e o cliente escolhe pelo qual quer/pode pagar. E isso, na prática, quer dizer um trabalho completo. Mais do que o logo. A experiência do cliente com a marca, a programação visual e seus desdobramento. É o que preocupa o Apocalypse: “muito mais que a identidade visual da empresa/produto, (a marca) engloba toda a experiência de o cliente vai ter com o produto, pré, durante e pós venda.”Marca ruim, crescimento ruim.
E aí, o papo que já estava bom, chegou a um ponto importante, quando tocamos na influência da qualidade do trabalho de construção de marca na tração de empresas nascentes. É fato que muitas delas não podem pagar a fortuna que um logo criado pelo Sagmeister & Walsh custaria, mas podem ter dificuldades para crescer por terem pago R$80 em um logo feito na banca de revista da esquina (com direito a mil cartões de visitas impressos). Talvez o ponto seja conseguir mostrar que uma empresa que aspira crescer, precisa investir mais em sua imagem, e isso passa pelo seu logo. E precisa estar sempre atenta ao fato de que o investimento em imagem é algo que nunca acaba, precisa sempre ser refeito, melhorado, re-inventado.Eu não sou seu público.
De repente, a questão tem a ver mesmo com o público a que se destinam estes serviços. Rafael traz um exemplo interessante.Eu acho que o SBT tem uma comunicação perfeita, deveria ser um puta case de posicionamento. Enquanto a Globo tem uma imagem inovadora, surfando a crista da onda, ditando as normas e trazendo novidades, o SBT se posiciona com uma imagem menos hype, menos novidade, mais Chaves e menos Big Brother. Eu não gostava do SBT, achava tudo muito feio, ruim, os programas eram “bobos” demais para mim. Até o dia em que me toquei que eu não sou o público deles, e para o público deles tudo isso é ótimo, tudo isso vende muito bem.O mesmo vale quando a gente afirma que, talvez, estivéssemos misturando criação do logo com branding. O Lázaro correu para lembrar que a turma que contrata o logo a R$ 80, mal sabe o que seria esta atividade. Seria uma relação muito próxima para o marketing quando acham que ele é igual a publicidade, por exemplo. "O cliente, na maioria dos casos, não entende nossas nomenclaturas técnicas e cheias de frufru". Adiantando-se também em defender o correto uso de nomenclaturas e técnicas, lembrou que o branding está mais ligado a gestão da marca, da cultura de consumo do seu público e postura. "Quando digo marca eu não falo de ID, é mais como uma personificação da empresa. Quando falam em coca cola você pensa no refrigerante? Ou no refrigerante com o rótulo vermelho? Quando falam em Kuat você também pensa no rótulo deles ou só no guaraná?"