Se alguém ainda acredita que é preciso ir para o trabalho trabalhar ou que é preciso fazer reuniões para discutir problemas e estabelecer metas ou, ainda, que é realmente necessário ter um escritório para ter um negócio, Jason Fried e David Hansson demonstram que não. Autores do livro Rework (no Brasil: "Reinvente sua empresa", Editora Sextante, 2012) e fundadores da empresa 37Signals, cultuada fabricante de softwares, a dupla ganhou milhões de adeptos no mundo dos negócios ao destruir mitos e criar novos conceitos sobre marketing e produtividade. E, principalmente, ao explicar por que ninguém trabalha no trabalho. “Rework” foi apontado como um dos melhores livros de negócios de 2010, avalizado em seu prefácio por nomes como Chris Anderson, Tom Peters, Seth Godin e Tony Hsieh. Como ainda não saiu a versão em português, resolvi traduzir alguns dos pontos mais polêmicos do livro. Seguem alguns dos mitos atacados sem meias palavras pelos autores:

Ignore o mundo real

A primeira dica dos autores é: “Ignore o mundo real”. Aquele mundo implícito na frase “Isso nunca vai funcionar no mundo real”. Ignore essa realidade pessimista e desesperadora na qual não existe a idéia de que pessoas podem ser colegas de trabalho mesmo morando em diferentes países, nem que é preciso gastar milhões em propaganda. Ou ainda que não é possível dar início a um negócio sem passar a vida inteira economizando para isso. O mundo dos negócios mudou muito. Já não comporta mais a ideia de que dar início a um negócio exige grandes investimentos, locações compatíveis, contratação de pessoal. Hoje, ninguém mais precisa sequer de escritório. E muito menos trabalhar mais de 40 horas por semana. Grandes negócios surgem de boas idéias e podem ser feitos mesmo em casa ou mantidos por pessoas que nunca se encontraram pessoalmente e vivem a milhas de distância umas das outras. Hoje em dia, apenas uma pessoa realiza o trabalho que antes era feito por dois, três, ou até mesmo por um departamento inteiro.
Não acredite no que eles dizem. Esse mundo pode ser real para os outros, mas não significa que você tenha que viver nele. O mundo real não é um lugar, é uma desculpa. Uma justificativa para não tentar.

Comece fazendo alguma coisa. Você precisa de menos do que julga

Faça alguma coisa. Ideias são baratas e abundantes, mas a ideia é apenas uma pequena parte do negócio. A questão é como executá-la. E mais, planejamento a longo prazo é mera especulação. Então chame de especulação e não de plano. E pare de se preocupar com ele. Preocupe-se com o que realmente interessa. “Ignore os detalhes, pelo menos por enquanto.” As coisas ficam melhores quando ficam menores. Diminua o tamanho da sua ambição e dos seus objetivos. Corte o que parece ser bom mas não é necessário, deixe para depois o que pode ser feito depois.

Tente resolver seu próprio problema e faça a diferença no mundo

“A maneira mais fácil de criar um grande produto ou serviço é fazendo alguma coisa que você queira usar.” Coloque o que você pensa em seu produto, faça alguma coisa que ninguém mais saiba fazer. Quando você quer resolve o seu próprio problema, sabe exatamente o que fazer e onde quer chegar. E se apaixona pelo que está fazendo. Para fazer a diferença no mundo não é preciso encontrar a cura para o câncer, mas apenas criar alguma coisa que pode facilitar a vida de qualquer pessoa. E com isso o produto ou o serviço atrai adeptos. “Se você vai fazer alguma coisa, faça alguma coisa que realmente importa.”

Ao trabalho: o fim das interrupções

Se você frequentemente fica até mais tarde e trabalha nos finais de semana, não é porque tem muito trabalho, mas porque você não está fazendo o que deve ser feito. E o motivo são as interrupções.
Interrupções são corrosivas para a produtividade: 45 minutos e então um telefonema, mais 15 minutos e o almoço... na tarde, uma reunião... E no final do dia restam apenas duas horas para fazer o trabalho. A solução apresentada pelos autores são as zonas de isolamento. Estabelecer períodos ou mesmo um dia semanal em que as pessoas não devem conversar. Trocar a confraternização da sexta-feira por uma terça-feira em que a comunicação é proibida. Parece irrazoável? Sem conversa o trabalho vai ser feito realmente. Ou então trocar as ferramentas comuns de comunicação, como ligações, reuniões ou conversas pessoais, por emails ou mensagens, que não precisam ser instantaneamente respondidos. Isso evita que se tenha que interromper o que se está fazendo.

Reuniões

Nas palavras dos autores: “Reuniões são tóxicas”. São as piores e mais frequentes interrupções no ritmo de trabalho. Tratam normalmente de ideias abstratas, fogem do assunto e não resolvem problema nenhum. Basta multiplicar o tempo gasto em uma reunião pelo número de pessoas nela presentes: uma reunião de uma hora com dez pessoas representa 10 horas de trabalho despendidos no encontro. Agora é só calcular o custo dessas 10 horas de trabalho e chega-se ao custo de uma reunião. Sem contar o tempo perdido em decorrência dela, entre interromper o que está fazendo, ir até a reunião, voltar ao trabalho e recomeçar o que foi interrompido. E o que é pior: reuniões procriam. Acabam gerando outras reuniões. Então, pergunte-se antes: será que ela é mesmo necessária?

Whorkaholismo

O whorkaholismo não é apenas desnecessário, é uma estupidez. “Trabalhar mais não significa que você está se dedicando mais ou que você está fazendo mais. Significa apenas que vocês está trabalhando mais.” Workaholics acabam liderando uma mentalidade estúpida: as pessoas ficam mais tempo no trabalho mesmo sem estar produzindo. “Ninguém toma decisões perspicazes quando está cansado.” E o que é pior, acabam criando mais problemas do que eles conseguem resolver. “Eles disfarçam a perguiça intelectual com a força bruta. Criam problemas intencionalmente, apenas para resolvê-los e assim trabalhar mais. Adoram ser heróis.” Mas o verdadeiro herói foi para casa porque descobriu uma maneira mais rapida e fácil de fazer.

Ilusões e abstrações

O mundo do trabalho é abarrotado de documentos que não servem para nada além de desperdiçar tempo: relatórios que ninguém lê, diagramas que ninguém entende e projetos que nunca viram produtos. Acabe com as abstrações e faça coisas concretas que realmente serão usadas.
Qualquer coisa além disso é apenas distração

Contratações e pessoal

Será que você realmente precisa de alguém para cumprir certas tarefas? Contrate apenas quando for imprescindível e não quando uma mera mudança na prática diária for suficiente para resolver o problema. E mais: “Nunca contrate ninguém antes de tentar fazer você mesmo. Dessa forma, é possível entender a natureza do trabalho e como ele deve ser feito.” Os autores são ainda mais radicais quando o assunto é contratação: “Curriculuns são ridículos.” São farças, todo mundo mente nos curriculuns. Sem contar que números e graus não dizem nada. O que realmente importa: como ou por quanto tempo alguém ficou fazendo alguma coisa? E o que exatamente significa uma boa formação acadêmica? Siginifica que que a pessoa passou muito tempo na escola e pouco tempo trabalhando. Vai levar mais tempo ainda para perder os hábitos que funcionam no mundo acadêmico mas são inúteis fora dele. No trabalho, não trate as pessoas como se elas tivessem 13 anos. “Quando você trata as pessoas como crianças, vai ter um trabalho infantil.” Por exemplo, empregados que precisam pedir permissão para ir ao banheiro, ou dependem de aprovação para todo e qualquer gasto. “Quando tudo exige aprovação, cria-se uma cultura de não pensantes.” E mais: “Qual é o ganho em proibir os empregados de acessarem redes sociais ou o YouTube? Nenhum. Esse tempo não se converte magicamente em trabalho. Eles vão apenas encontrar alguma outra diversão.”  Trabalhar oito horas por dia é um mito. Estar no escritório não significa estar trabalhando. “Pessoas precisam de diversão para romper a monotonia do dia de trabalho.” Sem contar o tempo e o dinheiro investido em TI para monitorar seus próprios funcionários.

Polêmica

Ainda que as dicas sejam pertinentes, deve-se levar em consideração que a empresa dos autores cresceu e prosperou num ambiente propício. “A experiência dos autores empresários é centrada na realidade de uma start-up de tecnologia criada no Vale do Silício e, portanto, em um ambiente de negócios bastante diferente do brasileiro.” (Thiago de Assis: Webcontexto) Mesmo assim vale a pena conferir o que Jason Fried tem a dizer. Disponível no TED, encontramos a palestra do autor, com legendas em português. Mais sobre o assunto: o site Resultson, traz a opinião de diversos especialistas sobre as das principais dicas do livro. Além do Rework, os fundadores da 37Signals são autores também do Getting Real, mais voltado para web e tecnologia, e escrevem no blog Signal vs. Noise. por: Elisa Mombelli