Todo freela passa por isso: aquela sensação de que seu contratante está ganhando em cima do orçamento que foi passado. O mesmo projeto que você orçou por 300 patacas, chegará como uma nota fiscal de 1.000 patacas na mesa do cliente. Difícil não? A boa notícia é que isso não é sensação apenas, é real. É prática do mercado. A notícia ruim é que muitos freelas ainda não acordaram e acreditam-se injustiçados, usados, pisados, quando, na verdade e sob determinado ponto de vista, estão apenas sendo valorizados. Mas a questão não é tão simples. O que dizer dos clientes e contratantes que, por vezes, confundem e passam a dançar uma música diferente onde o orçamento do freela pára no início, mas na negociação com o cliente é baseada em valores em escala ascendente, acompanhados de perto pelo Escopo? Alexandre Castro e Silva, consultor de usabilidade e diretor da Usability, nos conta o seguinte:
Conheço pessoas que ficam obcecadas por quanto os outros estão ganhando. Via de regra, são as mesmas pessoas que não se concentram o suficiente em negociar o seu próprio preço, em fazer uma saudável auto-crítica e descobrir o valor do próprio trabalho. Ou valem pouco e pedem pouco, ou valem até muito, mas não sabem negociar e são inseguras, e pedem pouco. E ainda não conheci a pessoa, cliente ou empresa que, diante de algo assim, oferecesse: "Meu deus, só isso? Não, seu trabalho vale mais, pode acrescentar 20% ao seu preço!" Resultado: às vezes, ganham menos do que pessoas que têm menos experiência ou trabalham menos. Vendo por esse prisma, não é nem difícil de entender porque ficam obcecadas pelo preço dos outros. Minha empresa, a Usability, trabalha como terceirizada de várias empresas desenvolvedoras de sites. Esse é um negócio importante pra nós. Em parte por causa dele, fazemos questão de nos restringir à consultorias de usabilidade, conteúdo e arquitetura da informação: não desenvolvemos sites justamente para não competir com essas empresas que nos subcontratam.
Ok Alexandre. Mas não podemos esquecer que aí estamos falando de empresas que tem funções complementares. Sob este ponto de vista, você está, na verdade, sendo agenciado pelo seu cliente. Você está agregando valor à oferta de outra empresa que, mediante a confiança que você fará um bom trabalho e a competência em apresentar suas habilidades como parte integrante de uma oferta ao mercado, pode, e deve, cobrar uma porcentagem por isso. O mercado publicitário tem até uma lei que regula este tipo de parceria. É a lei 4.680. Ela é de 1965 (alguém aí era nascido?), mas está valendo até hoje.
Peço R$20.000 porque R$20.000 é quanto acho que o trabalho vale pra mim. Se a empresa que me subcontrata conseguir tirar R$100.000 do cliente final e embolsa R$80.000, podem ficar certos de que ninguém ficará mais feliz do que eu. Pra começar, até pra futuros trabalhos e futuros clientes, é bom saber da valorização dos meus serviços. E, mais importante, quero mesmo que ganhem dinheiro em cima de mim, pois, assim, me chamarão para novos trabalhos. Se eu cobro R$20.000 e descubro que ele só conseguiu tirar R$25.000 do cliente, eu ficaria seriamente preocupado. Pensaria até em abaixar o preço. Senão, essa empresa nunca mais me subcontratará de novo. Alexandre Castro e Silva faz parte da Galerasolo. Leia sua entrevista aqui. Quer fazer parte também? Então responda as perguntas e mande-as, com foto anexada, para mail@carreirasolo.org
Em resumo, vocês estão praticando um jogo limpo. Mas não é o que sempre acontece. Poucas não são as vezes em que orçamento e escopo correm em paralelo à negociação oficial, lesando quem, efetivamente, vai fazer o projeto acontecer. Íris Freitas, diretora de arte, viu um projeto “simples” transformar-se em um imenso portal, cheio de funcionalidades e detalhes, não incluídos no orçamento inicial.
Meu contato era um “amigo” que estava representando um cliente Gringo. De início ele havia me dito que o orçamento era aquele, que o cliente tinha uma verba “x” e não teria como mudar. O projeto foi crescendo, crescendo e eu não tinha como cobrar mais. Logo depois, recebi um e-mail por engano em que descobri que o orçamento não tinha parado não, só a minha parte estava congelada. Depois dessa, nunca mais negociei sem um contrato relacionando tudo o que o projeto teria. Íris Freitas Duarte faz parte da Galerasolo. Leia sua entrevista aqui. Se quiser participar, responda as perguntas e mande-as, com foto anexada, para mail@carreirasolo.org
Ou seja, um caso clássico de má fé. Mas o freela deve estar preparado para essas e outras piores. A margem existe. Ponto. A má fé também. Vírgula. O importante é saber negociar, de preferência registrando tudo (escopo, prazos, preços, responsabilidades, premissas etc) desde a proposta até o contrato de trabalho. Não se sinta desvalorizado se seu cliente cobra 20% a mais do cliente pelo seu trabalho. Lembre que, em muitos casos, você estará utilizando os equipamentos do escritório do seu contratante. Que poderá contar com a estrutura de uma empresa maior para, inclusive, captar mais projetos. Por outro lado, não se deixe, enganar por outros que, tão freelas quanto você, bancam uma de atravessador de mão-de-obra. Cobrando mais sem precisar. Nestes casos, avalie se não vale a pena atender este cliente diretamente. Garanto que ele será melhor servido. Na verdade, o mundo ideal seria aquele em que tivéssemos alcançado a terceira margem, onde o trabalho freela estivesse regularizado o suficiente para termos tabelas de agenciamento. E que os profissionais de livre iniciativa estivessem amadurecidos o suficiente para não se deixar ludibriar por “empreendedores” de plantão. Daqueles que não podem ver um talento sem pensar no seu sustento. Críticas? Dúvidas? Sugestões? Opiniões? Comentem!