Jean-Baptiste Debret (1768-1848), Rideau de scène du Théâtre de la Cour à l’occasion du couronnement de D. Pedro I er.

Feudos e Mente Colonial no Mundo da Criação

Essa resposta em tom cretino eu recebi, com meus 20 e poucos anos. Já era formado com 23, pelo SENAI, porque eu, estagiário de uma grande agência do Rio, estava me prontificando a fazer uma ilustração, um trabalho bobo, para um pequeno anúncio que saiu as pressas e não tinha ninguém pra fazer. Isso levou, ao final, para uma armadilha comum nesses ambientes, um boicote. Acabei saindo da agência. E como é difícil explicar que dá pra gostar de samba, heavy metal e bossa nova… dammit! Passei a vida toda sofrendo com essa questão, eu não caibo em nenhuma definição padrão de profissional. Até agora não consegui, nem via frila, capitalizar em cima disto ou achar alguém/empresa que reconheça isso. But, what the hell?

Ainda Feudos coloniais...

Na Europa e nos Eua, a versatilidade brasileira é extremamente bem vista tanto quanto a nossa rapidez e capacidade de se virar em condições adversas. Aqui, sinal de atraso, certamente, busca-se por definições estanques e feudos são formados, onde os detentores das posições morrem de medo dos estrangeiros que batem na porta da cidadela. Perdem eles, perdemos nós, os estrangeiros, perdem as empresas. Mas, ainda bem, isso está mudando. Hoje, vislumbro uma luzinha no fim do túnel e ainda bem que não é o trem vindo. Anos e anos dando de cara na porta estão servindo para alguma coisa e, como disse o Luli Radfahrer num Braincast que não me lembro extamente, a gente tem de se preparar para estar ativo até os 80 anos, eu espero que o ditado "antes tarde do que nunca" seja, de fato, verdade, pois, por causa de anos de falta de habilidade em lidar com isto, quase entrei num ponto irreversível da minha vida profissional. No meu atual trabalho, tenho conseguido pequenos avanços, mas ainda é complicado. Explicando. Sou formado em design gráfico, mas por causa da grana inicial maior e de talento próprio, caí direto para a área mais técnica, de pré-impressão e finalização e, como desenho, desde moleque, o caminho para a ilustração e para os retoques digitais foi natural, o que me levou para a área de controle de cores e imagem que é, mais ou menos, restrita porque envolve talentos bem específicos. Quando quis tentar, além disso, exercitar minha formação em desgin, logo logo descobri, para meu descontentamento, que existe uma Casa Grande e Senzala nos ambientes de trabalho em agências. Esta outra pérola eu ouvi quando ainda era colega do Mauro, em outra grande agência "cara, você não é arte finalista mesmo, você é criativo, tinha de estar trabalhando do lado de cá e não do lado de lá". Por quê não posso ser os dois, ou os três, quatro ou tanto quanto eu possa ser? e porque isso não é reconhecido e devidamente apreciado? A resposta é simples, gente com muitos talentos gera medo. Medo de que os outros sejam balizados por você, pois "daqui a pouco vão querer que eu ilustre também", e por aí vai e, quanto mais alguém exibe com orgulho e proficiência suas habilidades, mais o cerco aperta, mais os senhores sentem seus feudos ameaçados. Daí entra-se num ciclo ruim, destrutivo, de não aceitação e sentimento de inferioridade e injustiça, o que leva a revolta e a falta de inteligência que determina o fracasso, por vezes, bem próximo do sucesso. Bem, agora vamos a parte boa da coisa.

Divulgação em escala mundial

Na "minha época", só havia o portfólio padrão e poucos meios de mostrar qualquer coisa, ainda mais se fossem técnicas, porque não dá pra pôr em portfólio e, por outro lado, não dá pra montar portfólio se dedicando 24/7 a ralar resolvendo pepinos variados em gráficas e bureaus. Mas hoje, a situação melhorou e muito. Hoje, através de um bom blog, de um flickr e etc, dá para cada um montar da maneira que achar melhor, um trajeto, uma bula, um escopo do que pode fazer e, montando uma boa história ao redor e com paciência e um pouco de acertividade, dá pra chegar lá, porque aí não é mais uma chance a pedir ou torcer pra alguém confiar, os trabalhos estão ali, os cometários estão ali, a explicação está ali, e as coisas são muito mais claras desta forma e, hoje, essas ferramentas são tão bem ou mais aceitas do que um portfólio tradicional. E o mais importante é que você passa a ser a sua própria empresa, mesmo estando empregado. Não é mais a empresa que te empresta visibilidade "ah, eu sou o fulano da Agência Tal", isso não mais existe. Hoje podemos expressar numa medida muito mais recompensadora e verdadeira a autonomia do que sabemos e gostamos de fazer independentemente de rótulos. Quem ainda pensa em feudos, é bom repensar e não há volta. Se você é assim, multitalentoso, não espere reconhecimento, não se revolte. Faça um plano. Abraço e boa sorte.