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Por indicação do Arthut Xexeo, parei ontem para dar uma olhada no Grey Gardens (HBO Films, 2009), filme que reconta a vida nada convencional das Edith Beale (mãe e filha homônimas), ex-socialites fracassadas americanas, durante um quase infinito período de decadência de 40 anos, entre 1936 e 1975. Até aí, você pode dizer “Ok, quem nunca ouviu falar de histórias de decadência, ainda mais na década de 30 onde os EUA afundaram de vez com a Grande Depressão?”. Mas Grey Gardens está aqui por outro motivo.

A história real

200px-GreygardensExpressão mágica do cinema moderno, as histórias baseadas em situações reais atraem nossa atenção a priori. Nesse caso, não faltam motivos. Primeiro, as duas eram tia e prima de, ninguém mais ninguém menos do Jack O., ícone da elegância americana. Segundo, quando se fala em decadência isso inclui no caso de Grey Gardens uma casa (uma vida?) sem manutenção por 40 anos, com lixo, restos de comida, dejetos dos 80 gatos, notificações da prefeitura, rostos, roupas, móveis e carros apodrecendo a céu aberto, na comunidade de elite de East Hampton. A notificação e posterior chegada do caso aos jornais e revistas leva a famosa prima a reformar casa (a mãe se recusou a vender até a morte) e atrai atenção de dois cineastas que decidem registrar num documentário a inusitada situação. Esse foi o ponto de partida no filme da HBO, reconstruindo esse momento, com Jessica Lange (mãe) e Drew Barrymore (filha), e a chegada da dupla de cineastas Vale comparar essas duas cenas a primeira do documentário original e a segunda, do filme da HBO.
Um trabalho bem interessante, com destaque para Drew Barrymore.

“Um dia minha segunda chance virá.”

Entramos, então, no ponto que queria expor por aqui. Grey Gardens, em complemento ao drama pessoal e familiar, é uma lição importante sobre “esperar sua segunda chance.” Quantas vezes ficamos parados vendo nosso mundo desmoronar, ou a imaginar um mundo que não existe mais, a espera da super chance que nos tirará da miséria, do marasmo, da empresa que não entende você? Como diz Little Eddie, “às vezes é muito difícil separar o presente do passado”. A lição do filme pra mim é outra: preso a essa miopia, a maioria simplesmente se recusa a escrever o próprio futuro.

Estranhamento: é assim que você vai para frente.

Uma das práticas mais curiosas a se praticar nesse mundo de clientes e projetos é o estranhamento. Chamo de Estranhamento aqui a capacidade de retirarmos esse véu de miopia da rotina e práticas profissionais corriqueiras para vislumbrar a realidade, ou as várias realidades que nos envolvem. Publicitários ao praticar Estranhamento entendem o quão inútil é ficar batendo na mesma tecla das situações, casting e gírias de classe média paulistana para comerciais de alcance nacional. Empreendedores de internet ao praticarem o Estranhamento descobrem que um mundo que funciona só no timeline de seus twitters (coloque no lugar de twitter o nome do aplicativo mais famoso de todos os tempos na última semana, ok?), não reflete a realidade da internet nacional. E com isso, impedem o crescimento real da indústria, ou seja, a realização das potencialidades de sua ferramenta: na educação, no processo de inclusão social e resgate da cidadania, na simplificação de processos governamentais etc. Educadores ao praticarem o Estranhamento entendem que são hoje facilitadores, canais, seres inspiradores e não mais ejaculadores de conteúdo semi-pronto. Enfim, você, leitor, ao praticar o Estranhamento, entende de uma vez por todas que um filme não é só um filme, não é só um filme, não é só um filme. Vale então, da próxima vez, avaliar o estado de coisas e olhar para seuu Grey Gardens interior e perguntar em que ano afinal, você está ou estacionou: 1936? 1975? Ou 2009? Referências fundamentais: