- Qualquer coisa vale a pena para estar aqui. Esse é o meu primeiro emprego de carteira assinada.Aquilo me chocou. Sempre me surpreendo como o sonho da carteira assinada é tão forte para boa parte da população brasileira. Pra mim, por outro lado, quando a minha foi assinada pela primeira vez, confesso, não achei a mudança nada boa. É claro que é tudo uma questão de contexto. Eu tinha mais de 30 anos, e passado mais de 14 como freelancer ou dono da minha própria empresa. Em suma, um burro velho empreendedor que curtia mostrar a carteira vazia como sinal de coragem e liberdade. Coisa de menino. É óbvio que o destino não aceitou essa bazófia e me forçou a recorrer ao emprego formal por uma série de dificuldades que uma das minhas empresas passava, leia-se falência, e pela mudança de rumo da outra. Sim, naquela época eu tinha duas empresas; trabalhava de segunda a domingo, em geral das 8 da manhã às 10 da noite, e, ainda assim, quando encarei um emprego de 8 a 5 com salário certo no fim do mês sentia saudades do tempo de empreendedor. Os primeiros meses foram particularmente difíceis. Esperar pra ir trabalhar, coisa que fazia nas primeiras horas da manhã em casa para ter mais tempo à tarde; a sensação de ser vigiado pelos espíritos malignos do presenteísmo, o que me inibia até de ler um livro durante o "sirviço"; o primeiro feedback (esporro) que recebi pois almoçava cedo demais (“quê, mãe?”); e a cruel prática de matar tempo mesmo quando o trabalho já estava pronto me faziam sentir como se estivesse vivendo num mundo de fantasia com suas próprias regras. - Mas isso não faz sentido - eu costumava me abrir com um colega mais compreensivo. - Pois, é, também não concordo, mas fazer o que? Sempre foi assim - me respondiam com o mantra corporativo. Depois do terceiro mês que me concedeu a segurança no trabalho (conceito que até hoje não compreendi), comecei a questionar se iria conseguir aguentar viver nesse mundo por muito mais tempo. Quando era fornecedor, eu tive, é óbvio, contato com esse tipo de loucura, desde a gerada pela Exame até a causada pela The Economist, passando pela cria da PM World. Mas era esporádico e havia a proteção de ir trabalhar em casa ou na minha empresa. O foco era sempre a entrega e não o meio, a reunião, o comitê e a política. Além disso, podia compartilhar com os meus sócios minhas observações de forma aberta sem estar criando "fofoca organizacional". O que eu sentia, descobri naquela época, era falta da liberdade para trabalhar. As intrigas palacianas e as mesuras hierárquicas que mantinham as estruturas de poder nas empresas estavam matando o meu espírito e me afastando das realizações que me energizavam. Foi nesse momento que a solução para os meus problemas apareceu. Havia um projeto doido e complicado de aplicar treinamentos presenciais para 2000 pessoas em todo país em caráter de urgência. Ninguém queria ir, além do gestor do projeto. Vendo ali uma oportunidade de fazer algo significativo e aumentar o contato com os clientes de fato, me candidatei. Uma semana depois estava indo de Rio Grande à Floresta Amazônica sem parar. Durante 6 meses. Foi cansativo, mas foi a minha salvação. Em contato com os clientes pude conhecer suas necessidades e repensar as atividades da gerência onde estava; um pouco afastado das intrigas palacianas me senti mais à vontade em trocar ideias com transparência; e sem a pressão do famoso "sei que não serve de nada, mas o gerente fulano de tal pediu isso pra ontem" comecei a planejar o meu trabalho. Graças a essa oportunidade, apreendi a ser um empreendedor dentro de um ambiente corporativo. A duras penas, mas aprendi. Se você está vivendo a mesma situação que vivi, ou precisa de aliados de espírito empreendedor dentro dos seus clientes, esqueça toda a bobagem que leu nas Você S.A. da vida. A minha dica é simples. Estimule apenas três pequenas coisas: [caption id="" align="alignnone" width="640"] É possível e imperativo que você reinvente a roda se quiser empreender no mundo corporativo[/caption]